Tom Zé: o dólar não é real

Postado por Geraldo Honorato



Sabe aqueles dias em que o cabra tem a obrigação de escrever, um monte de idéias (abaixo o novo acordo ortográfico) soltas na mente, mas não sai absolutamente nada? Pois é, esse é o quadro de momento. Para ver se pintava inspiração, folhei um exemplar antigo e manchado de Caros Amigos, e li - em vão - algumas linhas da entrevista de Ariano Suassuna. Nada. Liguei a tevê, zapeei por mais de uma dezena de canais e, como num passe de mágica, assisti um clipe de Tom Zé. Pronto, achei a tão perseguida pauta.

Decidi escrever em letras garrafais que Tom Zé, artista baiano revelado nos anos 60, é o cara. Pouquíssimos artistas fizeram da vanguarda musical e das experimentações moradia tal qual ele faz. Como se sucedem com todos os talentos dominantes, o reconhecimento da sua arte só se dará na posteridade. Por falar nisso, o filósofo alemão Nietzsche costumava dizer que não escrevia para os leitores da geração dele, mas para as pessoas de outro tempo.

Natural da sertaneja cidade de Irará, o septuagenário Antônio José Santana Martins é uma figura ímpar. Filho de comunistas e de “formação erudita”, será rebelde até o final dos dias. Provocar e chocar com letras sinuosas é a sua missão, tudo isso combinado com uma presença de palco insana e original. Além de cantor e tocador, é ator de mão cheia, pois vive profundamente a música quando a debulha.

No clipe que “espreitei”, Tom Zé manda o mercado financeiro “tomar na virgem” e, ainda por cima, queima a cédula de um dólar com um isqueiro de mercearia de bairro popular, daqueles que os fumadores de pacaio carregam no bolso. Imaginem só a story line da cena. De tão tosca e inconseqüente (mais uma vez abaixo o acordo feito pra quem não sabe escrever) é brilhante. É justamente aí, na galáxia dos loucos, que habita a magia. Sem auréolas de falso curador, isso é arte original, autêntica e tupiniquim. Cheia de incongruências, como é a cara marcada do Brasil, país rico de maioria morta de fome.

Certamente, nunca venderá mais de 100 mil cópias de “disco” e nem será agraciado com o Grammy Latino da categoria world music. O alento é que essa premiação não é lá parâmetro para muita coisa. Só para situar os desavisados, a apresentadora de programa de auditório e dublê de cantora Eliana já ganhou o Grammy. É óbvio que muita gente boa, a exemplo de Gilberto Gil e Milton Nascimento, também já venceu.

O fato é que Tom Zé continua sem fazer sucesso. Sorte dele, talvez. Ah, também prossegue polêmico e brilhante. Rápido como um raio, tem opinião para praticamente todas as prosas. É isso que o faz diferente, especial, assimétrico e inconceituável.

Como recado final, fica o ensinamento retirado da sapiência típica do Moleiro de Frioule: se for para ser mais do mesmo, é melhor até que não seja. Viva Tom Zé! O Cara!
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